sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A PIPA E A FLOR (prólogo)

 

A PIPA E A FLOR (PRÓLOGO)

                       Fiquei triste vendo aquela pipa enroscada no galho da árvore. Rasgada, ela girava e girava, ao vento, como se quisesse escapulir. Mas não adiantava. Você já viu aqueles bichinhos de asas, quando eles caem em teias de aranha ?  Era daquele jeito. 
                       Tive dó. Pipa não foi feita para acabar assim.
                        Pipa foi feita para voar.
                      E é tão bonito quando a gente as vê, lá no alto...
  Eu sempre quis ser uma pipa. Bem leve, sem levar nas costas nada que pese ( o que é pesado puxa a gente para baixo... ) Papel de seda, taquara fina que enverga, mas não quebra, linha forte, um pouquinho de cola e, pronto ! Lá está a pipa, pronta pra voar...
                    As cores e as formas ( que são tantas ! ) a gente escolhe aquelas que o coração está pedindo. Pipa, pra ser boa, tem que se parecer com os nossos desejos. ( E eu penso que as pessoas também, para serem boas, tem de ter uma pipa solta dentro delas...)
                    Não é preciso vento forte. Uma brisa mansinha deve levá-la até lá em cima, perto das nuvens. É por isso que elas têm de ser bem leves. O vento chega, as folhas das árvores tremem, e lá vão elas subindo, pra dentro do vazio do céu...
                    Só que tem uma coisa gozada. Pipa, pra subir, tem de estar amarrada na ponta de uma linha. E a outra ponta é uma mão que segura. É assim que a pipa conversa, através da linha. A mão puxa a linha e sente a linha firme, puxando pra cima, querendo ir.
                    E a pipa dizendo:
                    "Me deixa ir um pouco mais..."
                    Mas se a linha responde frouxa, é a pipa dizendo que está sem companheiro, o vento foi embora, e ela quer voltar pra casa...
                    Quando eu era menina, e me lembro, havia um homem...
                    Justo quando as pipas estavam lá em cima batizadas, carretilha sem mais linha para dar, ele vinha e comprava as pipas dos meninos. Pagava o preço justo.  Só que o gosto dele era cortar a linha. Quem nunca brincou com elas vai pensar que, com a linha cortada, vão subir cada vez mais alto, nas costas do vento, sem nada que as segure. Mas não é assim. Quando a linha arrebenta, começam a cair. E vão caindo sempre, cada vez mais longe, tristes, abanando as cabeças...


                                                                                                                                Rubem Alves

Um comentário:

  1. este também é legal nane...

    eu ja sonhei sendo pipa quando criança tambémmmm
    rsrsr
    muito bom memso este texto hein professorinha!!!

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